15 janeiro 2007

Entrevista de Matilde Ribeiro à Caros Amigos - 1 de 3



Marina Amaral -- Como a senhora conseguiu entrar na faculdade?

Eu sempre trabalhei e estudei. Acho que foi por esforço pessoal, junto com apoio familiar. Era contraditório, meu pai, ao mesmo tempo que achava que mulher não tinha que estudar porque ia casar e ter filho, também se orgulhava de ter uma filha com predisposição para estudar. E não colocava limite, mas achava que era uma carga muito pesada trabalhar e estudar. Lembro que na época de juventude... tem coisas na minha vida que foram precoces. Eu tinha um tio que sempre morou com meus pais. Ele era dez anos mais velho e a minha irmã é quatro anos mais velha, e por estímulo deles comecei a ir muito nova em bailes...


Thiago Domenici -- Mas a senhora já tinha uma posição política nessa época?

Não. Eu tinha uma curiosidade muito grande. O que me despertou para a militância política foi a expressão do PT dentro da faculdade, alguns professores, em especial a Erundina, ela nos levava para as favelas, pra fazer estágio de observação, levava para os cantões. E dentro desse espaço comecei a conhecer as feministas, e também os negros militantes. Comecei meu estágio com meninos e meninas de rua, depois fui trabalhar em creche. Aí não teve jeito, você convive com as crianças e as mulheres e comecei a ficar muito revoltada com a vida que as mulheres levavam. Percebia que as crianças pareciam ser filhos só das mães, percebia a ausência dos pais, percebia o quanto as mulheres levavam uma vida sacrificada, de deixar parte dos filhos sozinha em casa, outra parte na creche, sair pra trabalhar, voltar e pegar as crianças. E comecei a me envolver nesse universo da condição das mulheres, e a ficar amiga de pessoas feministas, comecei a freqüentar as reuniões e fui trabalhar depois em uma ONG feminista, que é a SOF (Sempreviva Organização Feminina), e nessa época me filiei ao PT. O que me despertou para a questão racial foi esse processo, mas para a militância efetiva foi mais tarde, em 1988, quando teve todo um debate em torno dos cem anos da Abolição da Escravidão e fui numa reunião do Movimento Negro, representando o Conselho Regional de Assistentes Sociais, eu fazia parte da direção. Trouxe isso pra minha vida profissional e pra minha vida acadêmica. Acabei estudando essas duas temáticas, gênero e raça, acabei trilhando toda a minha vida profissional e acadêmica a partir desse olhar militante.

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